Mata-me ou deixa-me viver


Acordar
Tomar banho, vestir-me, tomar o pequeno-almoço,
Procurar as chaves, não estão no sitio delas,
Bater a porta com força porque a fechadura está perra
Pôr música nos ouvidos para entreter-me
Estar agradecido por poder caminhar até ao trabalho
Caminhar quinze minutos até ao escritório
Dizer olá às pessoas por educação
Sentar-me
Secretária, cadeira, rato, computador
Um pouco de redes sociais, a vida dos outros para animar o meu dia
O admirável mundo incríveis dos outros onde tudo é incrível, que porcaria
Daqui a uma hora vou ver mais um bocadinho, que vida sem sabor a minha
Aquecer o almoço, Almoçar
Segundo café para não adormecer
Mais redes sociais, mas foda-se porquê outra vez?
O dia está a chegar ao fim, será que teve sol? Será que choveu? Não sei, não tenho janelas na sala onde trabalho
18h, em Dezembro, já é de noite, hora de retirar-me para casa
Abro a porta de casa
Miúdo fica radiante de me ver e eu também, é o melhor desta vida
Brinco com ele quinze minutos, dou-lhe banho
Ela prepara o jantar eu dou-lhe o jantar
Ela vai adormecê-lo e eu lavo a pilha de pratos, tachos e talheres
Arrumo os seus brinquedos
Sento-me no sofá são 21h30
O desgaste deixa-me a cabeça num farrapo, só quero não pensar
Ponho uma série, uma dessas que está na moda, vivo ansiosamente a história que me contam
Quero ver mais um episódio, mas é tarde, contra a minha vontade vou dormir
Acordo e começa tudo exatamente de novo

É isto?
Quantas vezes precisa de repetir-se a mesma história para perceberes que a tua história não tem vida?
Quantos copos de álcool definem um alcoólico? Quantos dias de cobardia definem um cobarde?
Quantas mais dias são precisos para enfrentares os teus medos?
O que é que é preciso para escolher a verdade em vez do conforto?

Com a pistola carregada ao meu lado, com a loucura mais viva do que nunca
Hoje escolhi a vida , a partir de hoje vou só escrever, e o resto que se foda.